O mapa da mina do cinema

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Por Belisa Figueiró
Quando um produtor decide fazer um filme, a jornada é longa. Não só pela escolha dos atores, locação, desenvolvimento do roteiro ou detalhes afins. A estrada fica tortuosa mesmo na hora da captação de recursos para bancar o filme. Mas não é sempre assim. No Brasil, o que antes foi pesadelo, hoje é sonho para algumas produtoras que mais conseguiram captar recursos para filmar por aqui. E, claro, o resultado de uma equação com bom capital só pode ser em altos índices de público.
As produtoras de cinema que mais captam recursos públicos também são as que fazem mais filmes, as que têm maior público e a maior renda nas bilheterias no Brasil. Com atrizes de telenovelas e artistas conhecidos do público na maioria dos seus filmes, o produtor Diler Trindade é o campeão nos quatro quesitos. Foi ele, inclusive, quem investiu nos primeiros filmes da Xuxa e com ela conquistou boa parte dos espectadores do cinema nacional nas últimas duas décadas.
De acordo com os dados da Agência Nacional do Cinema (Ancine), entre 1995 a 2008, a Diler & Associados captou R$ 88 milhões pelas leis de incentivos fiscais, o que representa 9,94% do total. Com o montante, a produtora fez 25 filmes, levou 24 milhões de pessoas aos cinemas e arrecadou R$ 127 milhões nas bilheterias. A Conspiração Filmes e Entretenimento também aparece com destaque: segunda maior renda, segundo maior público, terceira maior quantidade de filmes lançados e a terceira maior captação, com R$ 46 milhões. Ou seja, 5,24%.
No ranking das dez empresas que mais captaram, estão também: Filmes do Equador, Videofilmes Produções Artísticas, Lereby Produções, HB Filmes, O2 Produções Artísticas e Cinematográficas, Sky Light Cinema Foto e Art, Tambellini Filmes e Produções Audiovisuais, e Total Entertainment. Juntas elas captaram 37,54% do total de valores autorizados pelas leis de incentivo federais, excluindo os editais de fomento direto e outras fontes de recursos.
Mas, afinal, qual é a relação entre a quantidade de recursos captados e o sucesso nas bilheterias? Tirando a Diler & Associados – que é o maior exemplo da relação direta entre os quatro resultados – outras produtoras também conseguiram fazer mais filmes e arrebatar uma boa parcela do público ou da renda, como Conspiração, Videofilmes, Lereby, HB, Total, Tambellini e O2.
A Filmes do Equador, apesar de ter a segunda maior captação (R$ 52 milhões ou 5,87% do bolo total) não agradou tanto assim e ficou bem longe do pódio, ocupando a 12ª posição no quesito público, com apenas 3.061.960 espectadores. A produtora pertence à família de Luiz Carlos Barreto e é responsável por filmes como “O Que É Isso Companheiro?” (1997), “Bossa Nova” (2000), “A Paixão de Jacobina” (2001), e “Caixa 2” (2007). Na soma geral do período analisado, a empresa ficou com a quarta maior quantidade de filmes lançados (13 longas-metragens) e a oitava maior renda nas bilheterias (R$ 21 milhões).
Para Cristiane Freitas Gutfreind – professora de cinema da PUC-RS e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – os dados desmistificam o poder da Globo Filmes, que aparece no ranking entre as dez com maior público e renda, mas não entre os primeiros. “Isso mostra que o produto Globo tem força, mas não é total”.
As produtoras maiores e mais preocupadas em dialogar com o público, na opinião de Cristiane, ganham um espaço maior. No entanto, também aparecem no ranking as produtoras menores, que não necessariamente tem algum vínculo com a TV.
“Hoje o cinema não vive sem uma parceria com a televisão. Aqui no Brasil, isso ainda é incipiente, mas os dados comprovam tal relação. O público prestigia a qualidade e a preocupação estética e, apesar das dificuldades, sempre tem espaço para produtoras menores”, analisa a professora.
Caminho do sucesso
A chave do sucesso, para Diler Trindade, é encarar o cinema como uma indústria, fazendo pesquisas de opinião com o público e tentar descobrir o que ele quer, afinal. O produtor começou trabalhando com publicidade, a porta de entrada de boa parte dos cineastas e também dos produtores que estão no setor hoje. Depois de atuar em agências de São Paulo, o carioca decidiu mudar de ramo para poder voltar a morar no Rio de Janeiro, em 1985. Na época, as 15 maiores bilheterias eram dos filmes de Renato Aragão e dos Trapalhões e ele achou melhor investir num rosto novo para o cinema infantil: a então jovem e reestreante Xuxa.
O primeiro grande resultado foi em 1988, com “Super Xuxa Contra o Baixo Astral”. Logo depois, em 1990 – apesar da extinção da Embrafilme e o começo do naufrágio do cinema nacional –, Diler e Xuxa conseguiram levar 5 milhões de baixinhos aos cinemas para ver “Lua de Cristal”. A parceria deu tão certo que a loira foi responsável por boa parte da renda nas bilheterias que a empresa conquistou até 2006. Nos últimos anos, porém, o custo de produção dos filmes da Xuxa, estimado por Diler em torno de R$ 5 milhões, já não compensava mais. “A produção precisa ser coerente com a bilheteria para fechar a conta e isso não estava mais acontecendo”, contabiliza.
E mesmo liderando o ranking das produtoras que mais lucraram nas bilheterias, Diler garante que o sucesso de hoje não é mais como o de antigamente e que não consegue reinvestir o dinheiro da venda dos ingressos no filme seguinte. “Nos anos 80, nós tínhamos 36% de market share e eram feitos 100 filmes por ano. Hoje, para termos uma indústria que se movimente, é preciso que boa parte dos filmes nacionais tenham entre 5 e 6 milhões de espectadores”. Menos do que isso, segundo ele, mal paga os custos administrativos da produtora e somente com o Prêmio Adicional de Renda é possível capitalizar os próximos filmes.
A saída para dinamizar o mercado e reconquistar o público de milhões de espectadores, para ele, é criar mais salas de cinema em todo o país e baixar o preço do ingresso para os filmes nacionais. Assim, eles não competiriam com os estrangeiros que já chegam ao Brasil com os impostos pagos, ao contrário dos nacionais, que são tributados ao extremo, historicamente. “É como se você chegasse à vitrine e encontrasse uma Ferrari e um Gurgel pelo mesmo preço”, compara.
Com 20 filmes familiares no currículo, Diler reafirma que o cinema continua sendo a sua prioridade e o seu foco principal, mas que também já começa a se aproximar da produção de televisão, que gera um retorno mais rápido e menos riscos. No dia-a-dia, a empresa trabalha com cinco filmes ao mesmo tempo em diferentes etapas – pré-produção, filmagem, pós-produção e lançamento. Agora, esses projetos também são pensados não só para a telona, mas também com uma minissérie ou um especial de TV como produto final. Um dos projetos em vista é o filme “O Menino Maluquinho 3”, baseado no famoso livro de Ziraldo.
Xuxa na Conspiração
Depois do rompimento com a Diler & Associados, a Xuxa foi recebida de braços abertos na Conspiração Filmes, com a qual já foram produzidos dois filmes: “Xuxa em Sonho de Menina” (2007) e o mais recente “Xuxa e o Mistério de Feiurinha” (2009), que já tem mais de 1 milhão de espectadores. “Se ela ainda é uma boa marca? Claro que sim”, garante a produtora-executiva Eliana Soárez. “Conseguimos reunir um time incrível e o filme foi bem planejado desde o início com a Xuxa Produções, a PlayArte e a Globo Filmes”, conta ela sobre o longa mais recente.
O trabalho em parceria com a Globo Filmes e uma distribuidora começa desde a elaboração do roteiro e termina no lançamento dos filmes da Conspiração. Para Eliana, esse é um diferencial importante, que agrega muito valor, gerando bons resultados. A quantidade de recursos captados também interfere sempre no número de filmes produzidos, segundo ela.
“É fundamental podermos captar recursos incentivados no mercado. Em todos os lugares, com exceção de Hollywood e Bollywood, os filmes são produzidos com diferentes tipos de incentivos fiscais. Os recursos também interferem na qualidade, porque nós aprendemos com o tempo. O cinema nacional teve uma performance incrível em 2009. Se não tivéssemos captado recursos incentivados, seria outro resultado”.
Antes do sucesso absoluto de “Se eu fosse você 2” (2009), de Daniel Filho, da Lereby Produções, o recorde da retomada era “Dois Filhos de Francisco” (2005), de Breno Silveira, produzido pela Conspiração, que teve 5,3 milhões de espectadores. No ano passado, outro bom resultado da produtora foi “A Mulher Invisível”, de Cláudio Torres, que cravou a marca de 2,5 milhões de ingressos vendidos. Ao todo, no ranking, a Conspiração teve o segundo maior público do período analisado, com 8 milhões de espectadores, o que lhe rendeu a segunda melhor bilheteria, com R$ 57 milhões.
Assim como a Diler, boa parte dos filmes da Conspiração traz rostos televisivos, como o de Regina Casé em “Eu, Tu, Eles” (2000), e o de Murilo Benício em “O Homem do Ano” (2003). O importante, para Eliana, é que os filmes dialoguem com um público maior. “Para se ter um filme de sucesso de bilheteria, temos que falar com o público de classe A, B, C e D. Não pode ser um filme restrito às classes A e B. O cinema é um negócio de risco, ninguém pode prever com certeza se o filme fará sucesso ou não”.

FONTE
Revista Movie/ http://www.cenacine.com.br/?p=4653
Edição nº 06

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